Ventilação mecânica em Cardiopatas no COVID 19









Dentre os conhecimentos da terapia intensiva, um dos que mais gera receio entre os profissionais da saúde é a ventilação mecânica (VM). Vários parâmetros a serem monitorados, máquinas com muitos botões e natureza crucial desse suporte para a sobrevivência do paciente são alguns dos motivos para esse sentimento.

A dinâmica cardiovascular é toda baseada em variações de pressão. Fisiologicamente, a pressão intratorácica diminui no momento da inspiração devido à ação do diafragma e, com isso, influencia tão o sistema respiratório quanto o cardiovascular.

Na VM, ao contrário, temos um aparelho ativamente injetando ar nas vias aéreas. O resultado é uma pressão intratorácica positiva que resulta, conforme esperado, em uma dinâmica cardiovascular diferente.

O aumento da pressão intratorácica atua sobre as câmaras direitas reduzindo o retorno venoso e o débito cardíaco direito, enquanto que sobre as câmaras esquerdas ocorre uma redução da pós-carga. Esse último efeito ocorre porque, calculando a diferença entre a pressão externa sobre o miocárdio (agora positiva pela VM) e a pressão interna, a pressão transmural se torna menor que a fisiológica, diminuindo a força contrátil necessária para manter o débito cardíaco.

Não é de surpreender que esse segundo efeito seja até mesmo desejável, especialmente em casos de insuficiência cardíaca (IC) descompensada ou de doença arterial coronariana (DAC), em que a redução do trabalho do miocárdio contribui reduzindo sua demanda energética.

Contudo, toda a cadeia de eventos hemodinâmicos gerados pela pressão positiva da VM comumente resulta em queda da pressão arterial média (PAM). No caso da ventilação protetora, como a usada na Covid-19, existe um risco especialmente importante para isso: um dos parâmetros ventilatórios mais importantes nesse caso é a PEEP e quanto mais altos seus valores, maior a repercussão hemodinâmica da VM.

Na ventilação protetora, utiliza-se a PEEP, muitas vezes em valores altos, para tentar garantir uma troca gasosa adequada. Logo, manejar essa estratégia de VM em pacientes cardiopatas pode ser particularmente desafiador. Há, porém, formas de driblar esses efeitos.

Considerando-se que o débito cardíaco resulta de uma relação entre a capacidade de ejeção do coração e a resistência (pós-carga) contra a qual ele opera, o raciocínio fica simples: se a VM já diminui a pós-carga, interferir na capacidade de ejeção pode ajudar a compensar a falência hemodinâmica resultante dela. E, quando falamos em capacidade de ejeção, falamos de dois elementos essenciais para o volume sistólico: o status de volume intravascular e a contratilidade miocárdica.

Medidas como pressão venosa central, saturação venosa central, lactato, déficit de bases e outras podem fornecer elementos para se interpretar se hipovolemia ou descompensação de uma IC de base estão contribuindo para o choque. A correção desses dois parâmetros com soroterapia e inotrópicos frequentemente ajuda no controle do impacto hemodinâmico da VM em cardiopatas.

Contudo, vale lembrar que a ventilação protetora, incluindo a da Covid-19, envolve manejo conservador da soroterapia, uma vez que o balanço hídrico positivo pode piorar os parâmetros ventilatórios e a troca gasosa.

Também é importante lembrar que os esforços na VM protetora giram em torno de tentar manter oxigenação tecidual adequada. Na fórmula do fornecimento de O2 tecidual (o DO2), um dos multiplicadores é justamente o débito cardíaco. Portanto, o aumento da PEEP, mesmo auxiliando na dinâmica ventilatória, só vai ajudar na real oxigenação tecidual se quaisquer efeitos negativos da pressão positiva forem levados em consideração e compensados (com manejo da volemia e da contratilidade miocárdica).

Além disso, deve-se tomar cuidado com a oxigenação excessiva. Estudos mostram que a hiperóxia arterial tem sido associada a maior resistência vascular periférica, menor débito cardíaco e até mesmo redução do fluxo coronariano

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